- Há 83 apartamentos nesta situação; alguns são usados por aposentados e parentes de funcionário morto
BRASÍLIA — Destinados, inicialmente, a servidores de outros estados que vinham trabalhar em Brasília e que não eram efetivos, os apartamentos funcionais da União são ocupados por toda sorte de funcionários, alguns até mesmo aposentados ou parentes de servidor morto, o que contraria a regra. Há pelo menos 83 servidores que ocupam os imóveis e que, de acordo com o Portal da Transparência, não têm nenhum cargo na administração federal. O governo tem 86 ações judiciais tentando reaver imóveis ocupados de forma irregular.
Morar em um apartamento funcional é um ótimo benefício. Os servidores que têm direito a essa regalia pagam uma taxa mensal de ocupação, com variação determinada pelo valor total do imóvel em 0,01% do IPTU. Além disso, pagam a taxa de condomínio, em que pese que muitos se negam até mesmo a saldar esses encargos. Os servidores que não conseguem um imóvel da União recebem, mensalmente, uma ajuda de custo para pagamento de aluguel. O valor varia segundo a função, chegando, no máximo, a R$ 3 mil.
De acordo com as normas do Patrimônio da União, podem ocupar os imóveis ministros, secretários-executivos, funcionários de cargos de natureza especial e portadores de DAS 4, DAS 5 e DAS 6 (chefes). A União também pode emprestar o bem a agentes de outros poderes, como juízes ou parlamentares. Porém, as regras nem sempre são cumpridas.
Ocupantes desde 1973
Há exemplos de servidores que estão no apartamento desde 1973, e que podem estar aposentados — os nomes são preservados pelo governo. No total, segundo a assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento, há cinco casos de ocupantes de apartamentos funcionais desde a década de 70. No entanto, o Portal da Transparência aponta dez casos de servidores que estão no imóvel desde pelo menos 1973 e que não têm lotação em nenhum ministério.
Há vários casos também em que servidores com menos tempo de trabalho — de 2011, por exemplo — mantêm o benefício da residência gratuita, mesmo sem ter nenhuma função ou órgão de origem que justifique o benefício, o que significa que já não estão mais no Poder Executivo.
Por outro lado, alguns “locatários” têm função definida, mas não têm órgão de trabalho. Há até mesmo o caso de um funcionário da Advocacia Geral da União (AGU), órgão responsável por entrar com ações na Justiça para reaver os imóveis ocupados irregularmente, que está no apartamento, mas não tem função comissionada.
O mesmo acontece com outro servidor, do Ministério Público da União. E um outro, lotado no governo do Distrito Federal, mora em um apartamento funcional desde 1986, mas também não tem função. A assessoria de imprensa do GDF informou que secretários que não são de Brasília podem ter direito ao benefício da União, assim como outros funcionários, desde que se faça uma permuta com imóveis do próprio GDF.
De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento, há 86 ações judiciais em andamento para retomada dos imóveis. A assessoria esclareceu que nos casos onde não há menção à função do servidor “locador” do apartamento é porque “o servidor está mesmo sem função, aposentado ou falecido — neste caso, o processo é de retomada administrativa ou de retomada judicial”.
A Advocacia Geral da União informa que o problema é antigo e que muitos servidores consideravam que o apartamento que lhe foi emprestado é sua propriedade e, por isso, se recusam a sair. Além disso, muitos juízes acabaram dando ganho de causa a eles, o que dificulta a retomada.
Cristiane Souza Fernandes Curto, advogada-geral da União, afirmou que a AGU tem agido para que pessoas que deixam os cargos públicos desocupem os imóveis imediatamente. Se o servidor não desocupa o apartamento em até 30 dias depois que deixou o cargo, ele tem de pagar aluguel mensal, sob risco de sofrer uma pena de enriquecimento ilícito. O problema, em casos antigos, é que a Justiça andou beneficiando esses funcionários.
— No passado, achava-se que era um benefício ficar no imóvel pagando apenas a taxa de ocupação. Mas agora estamos conseguindo cobrar o aluguel, caso o funcionário não saia no período regulamentar — disse ela. — Alguns desembargadores entenderam que, mesmo perdendo o cargo, os funcionários têm direito a permanecer no imóvel. Mas vamos à última instância para tentar reaver o bem da União. O problema é que em certas ocasiões o servidor que tem de deixar o apartamento alega questões emocionais, o que acaba induzindo o juiz a atendê-lo.
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