quarta-feira, 15 de maio de 2013

Histórias de abolição, por Ateneia Feijó



Colegas, amigos e familiares não brancos, eu os tive a vida inteira. Na escola pública, em Santa Tereza, no centro do Rio de Janeiro. Nos cursos de ensino médio, em Niterói, do outro lado da baia de Guanabara. Na universidade federal e nos locais de trabalho, do lado de cá.
E em Bonsucesso, bairro de subúrbio carioca cortado pela linha férrea Leopoldina, onde morei numa casa com quintal e jardim. (Ainda não existia o Complexo do Alemão.) Lá convivi com médicos, professores e outros profissionais negros e mulatos de classe média tradicional.
Evidentemente, relacionava-me também com famílias modestas.
Mas aqui interessa ressaltar que na década de 1960 existia uma classe média negra. Pequena, porém significativa. Era formada por pessoas bem sucedidas, que preferiam exercer suas profissões em hospitais, colégios, faculdades e empresas nos subúrbios e na zona norte.
Por quê? Para se esquivarem de preconceitos e racismo nos pontos “VIPs” da cidade.
Entretanto, ao se fortalecerem economicamente, atravessaram os túneis e se espalharam pela “elegante” zona sul. Por serem em minoria, geralmente disciplinadas e discretas, tinham pouca visibilidade. Sobressaía apenas quem se incluía no mundo artístico ou esportivo.
Nas décadas seguintes, continuaram a progredir, investindo cada vez mais em educação. Com menos filhos.


Pretos e pardos pobres sem escolaridade tornaram-se naturalmente maioria nas estatísticas demográficas. Embora nem todos se deixassem vencer por políticas perversas de exclusão social, que não são de hoje.
Há 125 anos, intelectuais negros e mulatos ilustres estavam entre os militantes da causa abolicionista, fazendo a princesa Isabel assinar finalmente a Lei Aurea. Na época já havia no Rio uma classe média de pretos e mestiços forros, livres e empreendedores. Que trabalhavam por conta própria e possuíam bens.
O que aconteceu com eles? Por que desapareceram dos livros escolares? Continuaram a existir na economia e na vida política do país.
E a população rural de escravos libertados? Foi abandonada: nada se fez para incluí-la à sociedade civil. Guerra e pobreza na Europa facilitaram a política de imigração, trazendo gente branca para formar uma nova “força” de trabalho no Brasil.
Para piorar, durante o Estado Novo, a ditadura governada por Getúlio Vargas, havia a crença abominável de que um povo mestiço atrapalhava o desenvolvimento do país. Demorou até o brasileiro se orgulhar de ser miscigenado.
A propósito, meu filho não é branco.

Ateneia Feijó é jornalista.

2 comentários:

carlos eduardo alves de souza disse...

Interessane essa moça. Muito mais empenhada no seu lamento - aliás não entendo se é branca ou não-branca, tal como ela separa as raças no Brasil - do que na realidade histórica. Esquece, por exemplo, algumas grandes figuras de negros de muito prestígio no Império escravocrata, tais como os dois irmãos Rebouças e o poeta e jornalista Cruz e Souza. Pior é a injustiça que faz com Getulio - imaginem-me defendendo Vargas de alguma coisa -ao dizer que é ele quem estimula a imigração européia e que porfiava pelo embranquecimento da população. Ora, isto é muito, mais muito anterior a êle.Recomende-lhe, Roberto, abrir o GOOGLE e procurar a infuência do Conde de Gobineau na sua geração (Segundo Reinado), inclusive sobre PedroII.

Alberto disse...

Ter orgulho ou desprezo pela miscigenação em nosso país é ridículo. Qualquer levantamento científico da etnia dos brasileiros indicará que todos somos mestiços.
O dia que o governo aprender a lição, verá que as cotas de pretos, pardos amarelos, índios e roxos é uma gigantesca farsa de justiça social.
As únicas cotas aplicáveis são as que buscam reduzir o criminoso desnível entre ricos e pobres no país.
Os índices escandalosos indicam que os 1% mais ricos detêm a mesma renda que os 50% mais pobres.