sexta-feira, 17 de maio de 2013

Comissão da Verdade vai revelar centros de tortura e nomes de torturadores


  • Trabalhos de grupo criado pela presidente Dilma completa 1 ano nesta quinta-feira
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O coordenador da comissão nacional da verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, durante entrevista após reunião da Comissão Nacional da Verdade com comitês estaduais da verdade, memória e justiça
Foto: Givaldo Barbosa/25-02-2013
O coordenador da comissão nacional da verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, durante entrevista após reunião da Comissão Nacional da Verdade com comitês estaduais da verdade, memória e justiça Givaldo Barbosa/25-02-2013
BRASÍLIA - Balanço que a Comissão Nacional da Verdade divulga na próxima semana vai indicar os centros de tortura clandestinos utilizados pelos comandos dos órgãos de repressão durante a ditadura. Nessa relação constam casas e até propriedades rurais usadas para reprimir os opositores do regime militar. São locais até agora desconhecidos onde os perseguidos políticos eram torturados e até mortos antes de serem entregues às unidades do regime, como o DOI-Codi. A comissão identificou também diversos nomes de militares e agentes da repressão que atuavam nesses locais.
A Comissão da Verdade completa nesta quinta-feira um ano de existência. A presidente Dilma Rousseff, atendendo a pedidos de entidades e também da própria comissão, vai estender o trabalho por mais seis ou sete meses. Originalmente, o prazo de funcionamento é de dois anos, e se encerraria em maio de 2014. Pinheiro estava no grupo que se reuniu com Dilma na terça-feira e defendeu a ampliação do tempo de trabalho.— É um levantamento dos centros de tortura e um grande organograma no qual os espaços antes desconhecidos começam a ser preenchidos com nomes, cargos e instituições — disse Paulo Sérgio Pinheiro, que está deixando a coordenação da comissão.
— Temos uma lista de 1.500 nomes de torturadores e agentes, de uma listagem básica. Temos que descobrir se estão vivos, o RG (identidade), o último endereço. Já levantamos 250 nomes e entrevistamos 61. E é uma entrevista que tem que ser bem preparada, para não fazermos papel de tontos. O sonho de toda comissão é ter mais tempo de trabalho — disse Pinheiro.
O balanço da semana que vem apresentará vários documentos inéditos produzidos pelos órgãos de repressão e os nomes dessas 61 pessoas já entrevistadas pela comissão, e que estiveram envolvidas ou conhecem as práticas de tortura, de desaparecimentos e ocultação de cadáveres.
Revisão do ensino de história
Ao todo, a Comissão da Verdade já contabiliza 15 audiências públicas com familiares de mortos e desaparecidos, e depoimentos de 220 sobreviventes e testemunhas. Cerca de 16 milhões de páginas estão sendo digitalizadas.
A Comissão da Verdade também recomendará, no seu relatório final, que se faça uma “revisão drástica” do ensino de História nas academias militares. O grupo quer mudar a forma como o golpe de 1964 é ensinado e visto por essas instituições.
— É preciso uma revisão drástica do ensino de História nas academias militares, onde mentiras e mitos sobre 64 são repassados. Como a de que o golpe foi uma revolução contra o comunismo. Isso é história da carochinha. Esse golpe de 64 foi sendo preparado desde Juscelino Kubitschek. Esse desejo de imposição de ditadura em nome da segurança nacional é velho. Foi o terrorismo de Estado, que implementou uma ditadura. O ensino militar tem que ser compatibilizado com a democracia que estamos tendo — disse Pinheiro.
Esse argumento foi utilizado semana passada pelo coronel reformado Carlos Brilhante Ustra. Em seu depoimento público na Comissão da Verdade, Ustra disse que o golpe ocorreu para evitar a uma “ditadura do comunismo”. O coronel disse ainda que , se não fossem os militares, o Brasil hoje seria um grande “Cubão” (uma referência à Cuba) e que ele teria ido para o “paredón”.
Os centros de tortura vêm sendo investigados pela comissão, que já visitou a Casa da Morte, em Petrópolis. No local, militantes de esquerda teriam sido mantidos presos, foram torturados e mortos. Por lá passou o ex-deputado federal Rubens Paiva. Também em seu depoimento na comissão, Ustra garantiu que esses centros nunca existiram.
— Só porque um sujeito lá no interior de São Paulo tinha uma fazenda batizada com o nome de 31 de Março desconfiaram dele. Foram lá, vasculharam tudo e não encontraram nada. É tudo mentira — disse Ustra, na semana passada.
Comissão e militares mantêm diálogo
Outro ponto que constará no documento são as boas relações da Comissão da Verdade com o Ministério da Defesa e os três comandos militares. Pelo menos uma vez, conselheiros reuniram-se com os comandantes de Marinha, Exército e Aeronáutica, no Ministério da Defesa. O encontro foi mediado pelo ministro da Defesa, Celso Amorim.
— Ultrapassamos a fase do queimou ou não queimou documento. Neste primeiro ano ficou estabelecido que essa prática é ilegal. E, pela primeira vez em 40 anos, estamos dialogando com os três comandos. Foi repassada documentação. Esses militares que estão aí não têm nada a ver com os crimes praticados (na repressão). Os crimes dos que os antecederam, nós estamos pesquisando. E tem aqueles que estiveram envolvidos, caso do Ustra. Há um diálogo com as Forças Armadas de hoje. É um diálogo discreto, não dá para bater bumbo. Mas é um avanço — disse Pinheiro.
Segundo ele, o relatório final da comissão será contundente e vai reconstituir a veracidade dos crimes negados por seus autores diretos e mandantes:
— Depois do relatório, se fará verdade sobre os crimes da ditadura, e se estará mais perto do que nunca para que a impunidade dos mandantes e autores desses crimes não mais prevaleça.
Na semana passada, a audiência para interrogar o Ustra acabou em bate-boca. O militar se negou a participar de acareação com o vereador Gilberto Natalini, ex-militante de esquerda que declarou ter sido vítima de tortura. Ustra chamou Natalini de terrorista. O vereador reagiu chamando Ustra de torturador.


2 comentários:

Albert disse...

The truth should be taught everywhere and not only in the Military Academies.
It is well known that there was no risk of an extreme leftist takeover in the Goulart Presidency.
The return of Kubitschek would surely displace the leftists who wanted to force Goulart to cancel the coming election by promoting social unrest through strikes and public protests.
Unfortunately their wishes were realized when politicians convinced the Military to take over the Government and suspend the elections.
The coup of the corrupt conservatives backfired when the Military refused to step aside as they had done in previous revolutions.
The punishment of the crimes of that period should include those who tortured and killed on both sides as well as the political architects of the destruction of democracy in our country. Most of them are dead but creatures like Sarney are still around.

Symphronio de Labuquer disse...

Well said, Bertie. At least, partially well said, because it's so easy to place yourself as Monday morning quarterback - and that's what you're doing here. I do agree that the appeal for the military was a mistake, but, taking the Allende Government for example, how sure you'd be that Kubitschek could be able to outmanoeuvre the Marxist very strong wave that was prevailing all along Latin America in the whole of the sixties?