Governador nega apoio a Dilma em 2014 se o seu partido lançar candidato próprio
BRASÍLIA - Com a ausência da presidente Dilma Rousseff, o jantar que reuniu governadores do PMDB, além de ministros e líderes do partido, terça-feira em Brasília, transformou-se em um muro de lamentações contra o PT e contra o governo federal. E couberam ao governador Sérgio Cabral as maiores e mais duras críticas. Como previsto, Cabral deixou claro no encontro que não deverá apoiar a reeleição de Dilma caso o PT lance um candidato para a disputa estadual contra o vice-governador Luiz Fernando Pezão. O senador Lindbergh Farias é pré-candidato do PT à sucessão de Cabral. E, para completar, citou sua íntima relação com o senador Aécio Neves (PSDB-MG), pré-candidato do PSDB contra Dilma.
— Não é bem assim que a gente não tenha alternativa. Eu tenho relação com várias pessoas no mundo político. O nome do meu filho é Marco Antônio Neves Cabral — disse, apontando para o filho, também presente ao encontro.
Marco Antônio é filho do primeiro casamento do governador, com Suzana Neves, que é parente de Aécio. O vice-presidente Michel Temer, anfitrião do encontro, relatou à presidente Dilma as falas de Cabral, e, segundo interlocutores da presidente, a reação de Dilma foi de espanto. Outros participantes do jantar no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República, confirmaram ao GLOBO o teor da fala de Cabral.
Procurado pelo GLOBO, na quarta-feira, Cabral minimizou suas declarações e disse, por meio de sua assessoria, ter apenas externado que tem uma relação íntima com Aécio, mas que, ainda assim, várias vezes apoiou diferentes candidatos a presidente. O governador reiterou que “o grau de lealdade” estabelecido entre ele e Dilma não permite a existência de um segundo palanque para a presidente no Rio de Janeiro.
Elogios a Eduardo Cunha
Mas, segundo relatos de alguns dos presentes ao jantar, Cabral foi categórico com Temer, reiterando que, caso o PT lance um candidato, seu grupo político não apoiará Dilma. Cabral relembrou o início da aliança PT-PMDB no Rio, com seu apoio a Lula no segundo turno das eleições de 2006 — no primeiro turno, havia ficado neutro — e destacou a ampla vantagem obtida por Dilma no estado em 2010. Na mesma avaliação aos colegas do PMDB, Cabral disse que o cenário eleitoral do próximo ano, no entanto, seria mais difícil para a presidente, justamente pela intimidade que Aécio tem com o Rio, o que não ocorria com José Serra.
Em Washington, onde liderou esta semana uma missão parlamentar aos EUA, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, afirmou que disputas eleitorais como a do Rio devem deixar a presidente Dilma de fora:
— Ali (no Rio) é uma questão eleitoral que é para ser discutida sem ela, e sim pelos partidos. Temos que ter maturidade para encontrar uma solução.
Por fim, Cabral ainda disse ter recebido reclamações de vários empresários em relação ao governo federal, e que isso estaria motivando, inclusive, a ida deles para outros países latino-americanos, como México, Chile e Peru. Para Cabral, diante desse cenário, agora seria o momento de o PT ser “leal” como o PMDB foi nos últimos anos:
— Não tenho como segurar a tropa se o PT tiver candidato — afirmou Cabral, segundo relatos dos presentes.
A citação a Aécio foi o que mais incomodou a presidente Dilma, mas não foi o único ponto sensível a ela na fala de Cabral durante o jantar. O governador criticou abertamente, com apoio dos outros quatro governadores, a suspensão da renegociação das dívidas dos estados pelo governo federal e aproveitou para fazer um elogio ao líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, apontado por Dilma como inimigo número um de seu governo no Congresso.
Cunha é o relator do projeto de renegociação na Comissão de Finanças e Tributação e defendia uma proposta que poderia reduzir o montante da dívida dos estados em até 45%. Esse teria sido o motivo que levou à interrupção da renegociação. Cabral fez questão de dizer aos governadores que Cunha estava defendendo os interesses de todos os estados e reiterou que ele poderia ajudar todos os presentes na busca do acordo com o governo Dilma.
— Não deixem nosso líder sozinho. Ele tem sido muito importante nesse processo todo — pediu aos demais governadores, qualificando como “absurdo” o valor que os estados vêm pagando à União.
A questão das dívidas abriu a porteira para uma série de reclamações também contra a saída do Nelson Barbosa da Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda. Barbosa perdeu influência junto a Dilma para Arno Agustin, que é considerado por peemedebistas um dos responsáveis pela interrupção da negociação das dívidas. Em dado momento, até correu a piada que vem sendo repetida à exaustão no Congresso:
— A presidente trocou uma Brastemp por um Arno.
No PT, as reclamações de Cabral começam a causar irritação, e há quem aposte que, caso a popularidade de Dilma se mantenha em elevados patamares, o governador não terá outra opção que não seja incluí-la na campanha de Pezão. Na quarta-feira, em evento da Confederação Nacional das Indústrias, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se negou a dizer a quem apoiará nas eleições do Rio em 2014. Indagado sobre quem seria seu candidato no estado, brincou:
— É o Franklin Martins.
Lindbergh fala em chantagem
Lula negou, no entanto, que vá interferir para tentar melhorar a interlocução da presidente Dilma no Congresso e minimizou a crise com o PMDB:
— A presidente tem tanta gente que a apoia, tanto partido político, tanto líder. Acho que a presidente, depois de dois anos e meio, já sabe tranquilamente cuidar da política. Se o PMDB preocupasse o governo, não seria aliado do governo. É o óbvio.
Parlamentares do PT do Rio classificam como chantagem as posições do PMDB fluminense. Lindbergh Farias rebateu as críticas de Cabral:
— Eu não perco mais um segundo da minha vida respondendo a essa chantagem. O PMDB não manda no PT do Rio. O PT vai ter candidato e ponto.
O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) seguiu na mesma linha:
— Um governador de estado mandar recado para chantagear a presidenta da República é algo deplorável. É uma ameaça inaceitável, que tem como único objetivo retirar do PT o direito legítimo de ter candidato próprio. (Colaborou Flávia Barbosa, de Washington)
Um comentário:
A resistência de Cabral em relação às arbitrariedades do Governo Federal apesar de tardia é fundamental para seu futuro político.
Sua reação tíbia à investida do Executivo contra os direitos dos royalties do RJ no Pré-Sal abriu as porteiras para a pilhagem de nossas receitas por um Congresso ávido de recursos represados em Brasília derrubando o estabelecido em contratos anteriores com nosso Estado.
Agora que o PT tenta desferir o golpe de misericórdia em sua hegemônia política com um candidato próprio, finalmente Cabral se dá conta de que resistir é o único caminho para a sobrevivência.
Seu aceno para Aécio mostra que a liderança do Eduardo Campos na campanha do assalto ao Rio não será esquecida por aquí.
O outro Eduardo, líder do PMDB na Câmara, é um aglutinador indispensável neste cerco à DB (Ditadura Brasiliense) sôbre os Estados.
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