domingo, 19 de abril de 2009

Admirável Gado Novo - Alexandre Neto

Foi preciso que um repórter cinematográfico, brasileiro comum, de nome comum - Eduardo Torres - registrasse algo comum, para que o óbvio saisse da mesmice. Outro brasileiro comum - Zé Ramalho - já havia cantado, em cores vivas comuns, aquilo que comumente acontece a um "povo marcado", a um "povo feliz".
Certamente alguém do governo - ávido por abrigar eventos de vulto internacional -, com ar de espanto e estupefação, vai perguntar: "Que cidade é essa ?"
É a cidade, é o estado, é o país que os nossos políticos construíram ao longo desses anos, com falsas promessas, discursos demagógicos e elevado cinismo social. Bela cidade, não ? Lindo estado, né ? Ótima democracia que ainda ousa se dizer representativa, não acham ?
Às vezes nos sentimos na China, como verdadeiros chineses. Em nossa democracia totalitária descobrimos, vez por outra, a pólvora. Mas com muito barulho, apesar das pequenas explosões diárias que tiram o nosso sono e incomodam o nosso sossego, até mesmo em plena luz do dia.
As chicotadas que vimos acontecer - registradas pelo repórter cinematográfico Eduardo Torres - são resultado de acordos e negociatas feitos para que os mesmos de sempre permaneçam - ou se revezem - em cargos públicos. Sim, é esse o legado desses "anos vermelhos".
Esse é o País em que os integrantes da "classe dos acima de qualquer suspeita", embora corruptos, falsificadores, fraudadores, estelionatários e traficantes, sequer podem ser algemados ou encarcerados em celas sem o mínimo de conforto. O foro privilegiado lhes garante a impunidade... bela Justiça, não ? Ótimas leis, não acham ?
Continua faltando transporte urbano, disputado a bala pelas "milícias das vans". Falta ainda escola pública de bom nível. Faltam também hospitais públicos - ao menos para fazer um simples atendimento ambulatorial. Faltam salários dignos aos médicos, professores e profissionais de segurança pública. É assim: quem não investe em educação, constrói prisões e alimenta marginais.
Mas para todos os problemas já se tem culpados: são os "guardas" da SuperVia que, com colaboração de um soldado da PM, trataram os usuários como se fossem bichos. Bichos, não ! Como um "admirável gado novo".
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(Alexandre Neto é delegado de polícia no Rio)
(O Globo, 18/4)

Um comentário:

AAreal disse...

Ivanildo, foi preciso que um delegado de polícia, brasileiro comum, de nome comum - Alexandre Neto - registrasse algo comum, para que o óbvio saísse da mesmice.