quinta-feira, 20 de junho de 2013

“E agora?” ou “É agora?”, por Denise Paiero


POLÍTICA

Denise Paiero

O que quer a multidão que saiu às ruas, sem liderança, sem bandeiras claras? Os cartazes carregados por eles dão algumas pistas...
Os gritos animados de “é só o começo!” ainda ecoam nos meus ouvidos. Ainda meio atordoada com o movimento inesperado das ruas e acreditando na disposição dos que bradam que só está começando, pergunto-me: É só o começo de quê? Há dias me questiono: para onde vai essa história?
Algumas características dessa multidão meio sem forma que tomou as ruas brasileiras podem ser percebidas se olharmos um pouco mais perto as manifestações.
Acompanhei os manifestantes em São Paulo e uma das coisas que observei, em meio à multidão, na última segunda-feira, foi que a qualquer movimentação mais agressiva de algum participante, o grupo gritava: “Sem depredar!!!”, preocupado com o que havia acontecido em outras manifestações e tentando evitar que se repetisse.
Outro pedido constante: “Sem partidos!” era ouvido sempre que as bandeiras de tradicionais partidos políticos de esquerda (como PSOL e PSTU) eram erguidas.

Foto: Romulo de Sousa / G1 AM

A juventude sem partido é também a juventude sem bandeiras. Ou com muitas bandeiras. Ou melhor, com cartazes nas mãos – vi centenas deles – escritos com a velha técnica cartolina /canetão, que tanto ajudou nossos pais, e os avós deles, nas manifestações pró-democracia.
Mídia rápida, barata, que passa longe da tecnologia, e que permite gritar o que se queira e mudar de demanda quando se bem entender. Cartazes são leves, podem ser escritos na hora, podem ser compartilhados, transmitem mensagens instantâneas, para quem está perto e também para quem está fotografando.
A tecnologia das redes sociais ajuda a reproduzir o que foi escrito no papel. Uma análise geral desses cartazes ajuda a entender um pouco do que está acontecendo:
“Justiça!”; “Liberdade aos manifestantes presos”; “Fora Feliciano”; “Fora Alckmin”; “Fora Dilma”; “Fora Haddad”; “Não a Belo Monte”; “Educação para todos”; “Fim da corrupção”; “Abaixo a repressão”; “Não pagaremos mais R$0,20”; “Não é só por R$0,20”! Esses foram alguns dos cartazes que vi nas mãos dos manifestantes, havia dezenas, centenas de outros com as demandas mais variadas.
Essa quantidade de reivindicações mostra uma insatisfação geral, não focada, de uma geração que parece ter suportado todo tipo de incômodo calada, protegida do mundo real atrás das telas de computadores e que agora parece ter percebido a força que a presença física e a multidão têm.

Denise Paiero é jornalista e professora de Jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Doutora e Mestre em Comunicação e Semiótica. É autora da Dissertação de Mestrado "O protesto como mídia, na mídia e para a mídia: a visibilidade da reivindicação", da Tese de Doutorado "Mídia e terror: a construção da imagem do terrorismo pelo jornalismo" e do livro-reportagem "Foices & Sabres: A história de uma ocupação dos sem-terra".

Um comentário:

Alberto disse...

Estas manifestações sem líderes, sem agenda preparada em partidos ou sindicatos ou ONGs é a forma de protesto da modernidade.
Os políticos, sociólogos, filósofos e outros assemelhados não possuem ferramentas para entender o fenômeno.
A era da "Dataificação" do mundo iniciada neste século priorizou a busca de correlações de fenômenos em detrimento da pesquisa de suas causas. Hoje a estatística trabalha com modelos tirados de uma amostragem tão ampla de dados que o aumento do grau de certeza é tal que a busca da relação causa efeito são muito mais dispendiosa.
A motivação dos protestos vem da ordenação de prioridades do cidadão médio diante da massa de informações disponíveis e/ou de uma revolta diante da falta de informações procuradas.
Caso os donos do poder compreendam a situação e estudem as correlações envolvidas é possível que para garantirem sua sobrevivência passem a executar as reformas necessárias para atender às aspirações do Brasil.
É possível que este movimento sem líderes dê certo.