Perto do lugar onde ficará o palco do Papa, Lido tem rotina de prostituição, roubos e tráfico
Em frente, ficará o palco de onde o Papa Francisco, em julho, durante a Jornada Mundial da Juventude, assistirá à encenação da via-sacra, que reproduzirá o percurso feito por Cristo, na sagrada Jerusalém, após ser condenado a morrer na cruz. No entanto, a área da Praça do Lido, em Copacabana, lembra mais outros lugares nada virtuosos citados na Bíblia: Sodoma e Gomorra, cidades destruídas por Deus devido à prática de atos imorais. Naquele pedaço da orla, um trecho do calçadão é hoje o principal ponto de prostituição do bairro. Recebe não só adeptos do turismo sexual na cidade, como “órfãos” da boate Help, casa noturna de Copacabana que concentrava garotas de programa e foi fechada em janeiro de 2010.
E, se a área junto aos prédios é tomada pela prostituição, a praia naquele ponto é abrigo a céu aberto de moradores de rua. No local se reúnem menores e maiores, muitos deles usuários de drogas. Não raro, se juntam para praticar roubos. Fechando essa babel, no meio da praça funciona uma espécie de “estica” do tráfico (ponto de venda fora do morro) de favelas do Leme, que estão pacificadas.
A Praça do Lido propriamente dita é um parque gradeado, com cerca de 25 mil metros quadrados. É limitada pelas ruas Ronald de Carvalho, Belfort Roxo e pelas avenidas Nossa Senhora de Copacabana e Atlântica.
— Esta região vive extremos. De manhã, é um oásis. Mas, quando chega a noite e a madrugada, é um inferno — afirma José Carvalho, síndico de um dos prédios da região.
Esse submundo convive, não sem atritos, com a rotina de uma área com apartamentos luxuosos de até R$ 9 milhões. Além disso, basta uma leve caminhada para chegar a hotéis como o Copacabana Palace, onde a diária pode custar mais de R$ 2 mil.
exploração de menores é investigada
O principal ponto de prostituição do bairro fica no calçadão, na esquina com a Ronald de Carvalho. Naquele trecho, no número 1.424 da Atlântica, funciona o Bar Balcony, licenciado pela prefeitura para funcionar como restaurante. Apesar de o Código de Posturas proibir o funcionamento de bares em prédios residenciais (como é o caso) entre 1h e 5h e das recorrentes notificações, o Balcony está aberto 24 horas por dia, inclusive com música ao vivo. Seu público é eclético. Pelo menos 40 frequentadores da casa estão na mira de um inquérito sobre exploração sexual de menores, aberto pela Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav). Os agentes investigam uma rede de bares, hotéis e taxistas que promove o turismo sexual envolvendo menores.
— Durante as investigações, policiais se passaram por turistas. Muitas menores confessaram que usavam documentos falsos para trabalhar como maiores. Estamos investigando para saber se houve conivência dos estabelecimentos ou de turistas. No Balcony, apreendemos computador e documentos — conta o delegado Marcello Braga.
O Balcony também foi alvo de investigação da Delegacia Especial de Apoio ao Turismo (Deat), que lá prendeu, há cerca de duas semanas, Sara Raquel Rios Pinho, de 32 anos, acusada de integrar uma quadrilha, formada por travestis e garotas de programa, que assaltava turistas. Segundo as investigações, prostitutas se reuniam no Balcony para aplicar o golpe conhecido como “Boa noite, Cinderela” – as vítimas eram drogadas e tinham seus cartões de crédito roubados.
Não apenas os turistas são prejudicados. Uma moradora do prédio vizinho, no número 1.440, reclama: a prostituição afeta a segurança na região e desvaloriza os imóveis:
— Este apartamento (onde ela mora) tem cerca de 550 metros quadrados e é de frente para a praia mais famosa do país. Mas estou há um ano tentando vendê-lo e não consigo. Todos que vêm ver o imóvel percebem logo o movimento. À noite, é até difícil entrar na garagem, porque as pessoas ficam encostadas na grade, no meio do caminho.
Além do Balcony, completam a vida noturna naquele ponto as boates Krakóvia e Dolce Vita. Elas funcionam nas outras duas lojas do Edifício Ribeiro Moreira, cujos condôminos lutam para obrigar os estabelecimentos a respeitarem a lei ,que determina o fechamento entre 1h e 5h.
— Essas boates funcionam até de manhã. Às 9h, a rua está repleta de clientes saindo. É um absurdo — comenta um morador da Belfort Roxo.
Além da prostituição, moradores reclamam da presença da população de rua. Um carro da PM baseado de um lado da praça e uma cabine policial do outro não impedem os roubos.
— Fui assaltado no dia 18 de abril, às 20h. Um menor me tomou R$ 500. Ainda tentei pedir ajuda, mas não havia nenhum policial na viatura ou na cabine — conta o motorista Arthur Valente.
O ator Thiago Braga também sofreu um assalto no mesmo ponto, às 22h do último dia 20:
— Eu estava de carro quando parei no sinal na altura do Lido. Um homem armado, visivelmente drogado, bateu no carro. Perdi o iPhone.
Nenhuma das vítimas, no entanto, registrou o roubo. Segundo o delegado José William de Medeiros, da 12ª DP (Copacabana), a polícia faz operações na região diariamente:
— Quem estiver em movimentação suspeita e sem documentos é levado para a delegacia para ter os antecedentes checados. De qualquer maneira, as estatísticas não mostram uma situação fora do normal naquela região. As pessoas precisam registrar as ocorrências.
Já a presença de traficantes na Praça do Lido vem sendo combatida pelo 19º BPM (Copacabana). Em março, cinco menores foram detidos por vender drogas.
— Eles fazem aquele tráfico formiguinha, mas não usam armas. Desde que os morros da região foram ocupados por UPPs, as “esticas” voltaram, e o tráfico está pulverizado — diz um policial, sem se identificar.
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