"Fui tão fundo que quase bati lá no pré-sal", ainda exultava na segunda-feira o presidente fotografado dias antes dois metros abaixo da superfície do mar. Aleluia!, berraram milhões de brasileiros até então aflitos com o súbito sumiço da palavra resgatada pela frase de Lula, mas ainda ressabiados com o enigma: o que provocou a suspensão repentina, sem comunicados oficiais nem pronunciamentos em cadeia nacional de rádio e TV, do carnaval temporão decretado em agosto do ano da graça de 2008, sexto da era Lula, pela descoberta do despotismo de petróleo estocado nas profundezas do Atlântico?
Por que se dispersaram sem mais nem menos as procissões em louvor da descoberta do pré-sal, mais importante que o Descobrimento? Porque a turma das caravelas encontrou índios, araras e praias, e a Petrobras achou jazidas colossais guardadas pela Divina Providência durante milhões de anos para que coubesse ao maior governante de todos os tempos anunciar à nação e ao resto do mundo a entrada do Brasil na Opep, e posar para a posteridade no meio de sheiks árabes.
Do fim do inverno ao crepúsculo da primavera, acampado no andor principal, Lula improvisou orações em agradecimento ao Companheiro que lhe permitiria surpreender a Sapucaí, em companhia de Hugo Chávez, com a primeira aparição de uma dupla fantasiada de califa cucaracha. "Tenho tanta sorte que acho que Deus passou por aqui e resolveu ficar", desconfiou em setembro, extasiado com a demasia de dinheiro que garantiria aos pobres três refeições por dia, duas viagens por ano à classe média e a inclusão de um banqueiro da terra na lista dos 10 mais ricos do mundo. Generoso, prometeu aos diretores da UNE um sistema de ensino de desconcertar o rei da Suécia. Aos acidentados, um atendimento de emergência superior ao da Inglaterra. Aos enfermos em geral, a cura de todas as doenças por médicos incorporados ao sistema de saúde. Sobram verbas para todos, souberam ministros, governadores lulistas, criptolulistas ou simpatizantes, prefeitos e vereadores de cidades a menos de 100 quilômetros do mar. Sobra verba para todos e para tudo, gabou-se em novembro, mostrando as mãos enegrecidas de petróleo supostamente pescado no pré-sal do Espírito Santo.
"Tenho tanta sorte que lá no poço de Jubarte a Petrobras encontrou mais uma reserva de 2 bilhões de barris", reiterou. Sorte e paciência: a festa já começou, mas o festejado só jorrará para valer em 2014. Paciência e otimismo, confirmou a certeza de que a demora vai beneficiar a indústria nacional, porque enquanto os gringos produzem os equipamentos que nunca houve as fábricas daqui terão tempo para providenciar o muito que falta para encher milhões, bilhões de barris com petróleo sugado 7 mil metros abaixo do nível do mar. Sete quilômetros. Ou mais. Como conseguir, por exemplo, sondas de perfuração avaliadas em US$ 700 bilhões cada uma no mercado internacional? Com um presidente que reduz crise a marolinha ninguém pode, complicou no improviso: "Ou nós tomamos a decisão de fazê-las aqui, gerando tecnologia, emprego, renda e desenvolvimento, ou a Petrobras vai economizar US$ 100 milhões e comprar todas em Cingapura".
Na alusão ao pré-sal pode estar a explicação para o mistério aparente: o carnaval petroleiro vai recomeçar em 2010, com a companheira Dilma Rousseff como rainha da bateria e Lula puxando o samba-enredo costurado para celebrar a gestação do futuro nas plataformas espalhadas por 800 quilômetros de litoral. Quem melhor que a mãe do PAC, já com o filho aprendendo a andar, para vigiar os trabalhos de parto que serão concluídos em 2014, junto com a candidatura de Lula a outro mandato presidencial, a Copa do Mundo, a Olimpíada do Rio e o submarino nuclear encomendado pelo almirante Nelson Jobim e seu grumete de estimação Mangabeira Unger?
Em 2006, o presidente reelegeu-se jurando que o país se tornara auto-suficiente em petróleo. O Brasil paga R$ 5,5 bilhões por ano para fechar a conta de óleo e combustíveis. Dilma vai jurar que o pré-sal logo transformará o país em exportador de petróleo. O Brasil continuará importando barris e engarrafando a miragem no fundo do mar. Lula e Dilma parecem convencidos de que, no País do Carnaval, milhões de eleitores aceitam qualquer fantasia. Faz sentido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário