quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Esqueça a senha, por Luis Antônio Giron



Os códigos deixaram de ser secretos pela internet – e já não servem para muita coisa
Luís Antônio Giron, ÉPOCA
Você acredita em senhas? Então lamento informar que elas não passam de frutos da sua imaginação – ou de seu excesso de fé. Deixei de acreditar nelas no início de minha vida digital, tão logo minha conta bancária foi invadida pela primeira vez. Faz muito tempo.
Lembro-me da era adâmica da internet, no início dos anos 1990, quando as pessoas brincavam com as palavras e era possível cadastrar emails e domínios com nomes e sobrenomes simples e senhas com datas de aniversário. Como Adão no Velho Testamento, os desbravadores brincavam de distribuir palavras em um território inexplorado.
A palavra mágica era “pontocom”. Tudo se desdobrava dali. Mas a era nominalista logo acabou. Com o povoamento, os mais espertos tomaram posse das palavras. Os hackers apareceram e, com eles, aumentou a desconfiança entre os usuários. A segurança e a privacidade foram para o brejo. As senhas tiveram de ganhar uma certa complexidade alfanumérica. Em vão.
Isso porque a maior parte das pessoas, passados 20 anos da Idade da Pedra da rede, ainda usa senhas primárias, facilmente decifráveis. O consultor de segurança digital Mark Burnett listou as 10 mil senhas mais comuns na internet. A conclusão é que a palavra mais usada para senha é “password”, “senha” em inglês.
Em segundo lugar, “123456”. Seguem-se “12345678”, “1234”, “qwerty”, “12345”, “dragon”, “pussy”, “baseball” e “football” – só para ficar nas dez. Vale a pena consultar a lista porque ela comprova que o ser humano não é dotado de grande imaginação, nem mesmo quando lida com um vocabulário que se pretende secreto.
Senhas como “letmein”, “daniel”, “justin”, “tigger”, “robert”, “fuck”, “batman” e “test”, além de tantas outras compiladas por Brunett, poderiam compor o dicionário de ideias adquiridas sonhado pela dupla de lexicógrafos Bouvard e Pécuchet do romance homônimo de Gustave Flaubert.
As senhas mostram que a humanidade evolui com extrema lentidão. E que continua viciada em lugar-comum.
O problema é que as senhas são necessárias. Todo mundo é forçado a usá-las para entrar em contas de banco, redes sociais e sites. No entanto, assim como não existe o crime perfeito, não há senha perfeita. Os hackers possuem programas de decifração poderosos. Eles sempre arrumam uma forma de descobri-la, por mais complexa que possa parecer.
Se senhas deixaram de ser secretas, deixaram de ser propriamente senhas. Não ocultam segredos nem protegem ninguém.

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