Medo de ataque terrorista, medo de racismo, medo de machismo, medo dos bêbados. O metrô de Londres, que completou 150 anos na semana passada, não é só um incrível sistema de transporte, com mais de 250 estações. É também um dos pólos pelos quais os londrinos canalizam grande parte das suas angústias e desconfortos em uma das cidades diversas do mundo.
A ausência de sinal de celular parece aflorar o incômodo que os locais sentem, porque só há como canalizar a atenção para os jornais, jogos de video-game ou para o que o outro está fazendo. Confesso que já entrei na neurose metroviária depois de seis meses aqui.
Eles dizem que tudo mudou depois dos atentados de 2005, que mataram mais de 50 pessoas e que tiveram como principal cenário o metrô perto da estação central.
Qualquer bagagem, sacola ou mochila que não tenha ninguém por perto já ganha olhares assustados dos passageiros. Um aviso pede que funcionários do metrô sejam chamados se houver algo estranho desacompanhado. Um vez estava conversando com uma amiga e ela deixou sua mala cinco metros atrás. Não levou uma estação para alguém perguntar de quem era aquilo.
Ainda durante as Olimpíadas vi um casal de aparência indiana se beijar apaixonadamente no metrô. Duas estações depois, um senhor (talvez bêbado), começou a gritar que os dois deveriam “voltar para o Paquistão”. Ninguém defendeu os dois -- inclusive eu.
Uma busca na internet e lá aparecem dezenas de vídeos de “tube racism”. Negros e asiáticos são as principais vítimas. Alguns desses vídeos são chocantes e perguntei inclusive a um policial o que acontece com os racistas. Resposta: geralmente nada.
Nem de longe quero dizer que isto é pior do que o que temos no Brasil. Não há empurra-empurra como nas minguadas linhas, eles esperam nas laterais e só entram depois que quem quiser descer já esteja fora, dão passagem à esquerda nas escadas rolantes. Ainda assim, é no “tube”, como eles gostam de chamar o transporte, onde os londrinos se mostram mais tensos.
Andar de carro em Londres não é privilégio -- muitas vezes é desperdício. CEOs pegam metrô. Celebridades pegam metrô. Até o prefeito pega metrô.
David Cameron, 2008, ainda líder dos Conservadores, usuário do 'tube'
É certamente um exemplo diante de alguns lugares onde, também pela falta de transporte suficiente, usar a estrutura pública é para muita gente uma desonra. Mas é também ali onde esta cidade de gente tão educada mostra um dos seus piores lados.
Maurício Savarese é mestrando em Jornalismo Interativo pela City University London. Foi repórter da agência Reuters e do site UOL. Freelancer da revista britânica FourFourTwo e autor do blog A Brazilian Operating in This Area - Twitter: msavarese. Email: savarese.mauricio@gmail.com. Maurício estará conosco todas as segundas-feiras.
2 comentários:
Mesmo sem o atentado de Londres, o metro é um transporte mais estressante que outros. O confinamento em um recipiente fechado em baixo da terra provoca reações de angústia e medo não observadas na superfície. Talvez para serem mais eficientes os analistas devessem levar seus divãs para dentro do metrô1422 .
Tudo bem com o metrô de Londres, pela foto que só evidencia a força da velha Albion, que resistiu impávida à sanha nazista e demonstra que, da mesma forma, vai fazê-lo com a horda de colonos do Comonwealth que está recebendo de volta. Os capacetes nazistas não subiram pelos white cliffs of Dover e, se hoje, são os enturbantados de Bin Laden, desembarcados em Heathrow, que atormentam, a foto mostra que metrô continua com poltronas acolchoadas de veludo azul e à disposição do PM. A choldra carioca se soca em vagões que às vezes parecem aqueles que trafegavam via Auschwitz de tão entulhados, enquanto nossos PM (Primeiros Merdas) circulam etéreos em confortáveis helicópteros. É bem verdade que às vezes ainda cai um deles...com namorada e tudo...
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