sábado, 3 de agosto de 2013

Cartas de Seattle: Cidadão, não! Residente, por Melissa de Andrade



Não é uma lei nem nada, mas a Prefeitura de Seattle está evitando usar o termo “cidadão” porque pode ser ofensivo para parte da população.
Pausa para a patrulha do antipoliticamente correto achar um absurdo, argumentar que não existe motivo para que uma palavra tão corriqueira possa incomodar alguém, alfinetar que os Estados Unidos exageram nos cuidados para não ofender quem quer que seja e que desse jeito não se sabe onde vamos parar.
Pronto?
Pois é hora de apresentar um fato: boa parte das pessoas que moram em Seattle não são cidadãs. São residentes, mas não cidadãos. A diferença é enorme. Ser residente legal significa ter visto permanente para morar nos Estados Unidos e pagar impostos, mas não poder votar, por exemplo, porque este direito é exclusivo aos cidadãos de nascimento ou de naturalização. É mais ou menos como no Brasil.
Seattle tem estrangeiro para todo lado. Empresas como Microsoft, Boeing e Amazon recrutam milhares de profissionais todos os anos. Com eles, vêm as famílias. Ou seja, um passeio no parque ou no supermercado e você vai ouvir pelo menos três idiomas diferentes.
Os números não-oficiais são conflitantes e os números oficiais me parecem muito baixos. Quase 20% dos moradores de Seattle teriam nascido no exterior, diz o governo local. O número seria um aumento bem expressivo dos 5% de uma década atrás.

Foto: Kelly Smith @CC

Parece muito mais. A cidade é internacional. A impressão que se tem ao andar nas ruas é que a minoria das pessoas é que é nascida nos Estados Unidos. Nas empresas da área de tecnologia, sempre tem estrangeiro na equipe. Claro que os filhos adultos dos profissionais que se mudaram de outros países para cá há várias décadas ajudam a dar o tom internacional. Eles parecem estrangeiros, mas não são.
Por tudo isso é que, se eu escuto um discurso de um político falando que vai fazer isso ou aquilo para os cidadãos, boa parte da plateia não se sente incluída na promessa. Quando alguém noticia que os cidadãos de Seattle vão poder desfrutar disso ou daquilo, sinto que não estão falando comigo. Não é que fico ofendida, mas me sinto excluída.
Se cidadãos e não cidadãos trabalham duro, pagam impostos e compõem a multiculturalidade característica de Seattle, parece no mínimo adequado que a Prefeitura se dê conta disso e governe para os residentes, em vez de somente para os cidadãos. É por isso que “Seattleite” é o termo usado para quem mora em Seattle, não para quem nasceu aqui.

Melissa de Andrade é jornalista com mestrado em Negócios Digitais no Reino Unido. Ama teatro, gérberas cor de laranja e seus três gatinhos. Atua como estrategista de Conteúdo e de Mídias Sociais em Seattle, de onde mantém o blog Preview e, às sextas, escreve para o Blog do Noblat.

Um comentário:

Alberto disse...

Ao invés de criar firulas, precisam descobrir a real causa da vergonha que sofrem os residentes ao serem impedidos de serem cidadãos.