quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

E Yaoni enfim chegou, por Zuenir Ventura




Hoje ela é notícia de primeira página, mas há quatro anos, quando perguntei num artigo, “Vocês conhecem Yoani?”, pouca gente aqui sabia que ela já era uma das 100 personalidades mais influentes do mundo, segundo a revista “Time”. Que seu blog “Geração Y” ganhara prêmio no exterior como um espaço em defesa da livre expressão. E que por isso, e porque tinha quatro milhões de acessos por mês, era perseguido pelo governo de Fidel Castro.
A ironia é que o nome era uma herança da influência soviética na Ilha. Segundo a blogueira, a URSS deixara muito pouco, além de carros caindo aos pedaços e de nomes como o dela, começados por ípslon: Yaslis, Yanisleidi, Yoandri, Yusimí, Yuniesky. Eram jovens nascidos em Cuba nos anos 70 e 80, marcados “pela emigração ilegal e frustração”. Foi com essa tribo “cética e descrente do regime” que ela passou a dialogar.
No começo, “Geração Y” era um exorcismo pessoal para expulsar os “demônios da apatia, da dor moral, do medo”. Só que esses demônios habitavam milhares de outros espíritos e, aos poucos, o espaço se transformou numa “praça pública virtual onde há de tudo, gritos, insultos, discussões”. Yoani usa o verso de uma banda de rock local para se definir: “Eu não gosto de política, mas ela gosta de mim.”
Já que em Cuba “até respirar é um ato político”, o seu blog acabou tendo essa função de desabafo, de versão não oficial do cotidiano e suas mazelas, tais como racionamento, baixo padrão de vida, controle de comportamento, corrupção, mercado negro. Acusada por uns de ser agente da CIA e por outros de, no fundo, favorecer o governo mostrando que em Cuba os dissidentes podem se manifestar, Yoani Sánchez pagou caro por sua insubordinação intelectual: foi difamada, perseguida, presa e proibida de viajar.
“Durante seis longos anos tentei 20 vezes sair do meu país de forma temporária e recebi sempre a mesma resposta: a senhora não está autorizada a viajar”, declarou, já no Brasil, onde iniciou uma viagem por vários países da Europa e da América.
Não foi um começo fácil. Além da denúncia de “Veja”, de que há uma “conspiração cubano-petista” para “desmascarar” a blogueira, ela foi alvo em Pernambuco e Bahia de um pequeno grupo de militantes de esquerda, que a recebeu com xingamentos de “traidora” e violência (chegaram a puxar-lhe os cabelos).
Em vez de reclamar dos furiosos protestos que a impediram até de falar, ela deu uma lição de tolerância democrática, preferindo ver no episódio, que em Cuba só é possível quando a favor do governo, uma manifestação de liberdade de expressão a ser comemorada e desejada: “Quero essa democracia no meu país.”

Zuenir Ventura é jornalista

Um comentário:

Alberto disse...

Por onde anda o "brasileiro cordial" apregoado por Buarque de Holanda em "Raízes do Brasil"?