No momento em que a comunidade nacional começa a ouvir a expressão e receber os abraços de 478.846 candidatos (31.088 a prefeito e vice-prefeito e 478.846 a vereador), a pergunta se faz oportuna: o pleito municipal poderá ser o canal para jorrar água limpa na fisionomia de nossa política?
Como se sabe, seus dutos irrigam a base do edifício de nossa democracia representativa. A resposta à pergunta comporta a análise de algumas variáveis, a partir da condição que cerca a grande maioria dos 5.565 municípios brasileiros, que recebem pouco mais que 15% do bolo tributário.
A sofrível situação econômica das localidades mostra que de seu “mato não sairá coelho”. Ou seja, governantes de pires na mão, por mais hábeis que sejam na arte da prestidigitação, não conseguirão puxar o eixo da renovação, principalmente quando se sabe que este “empreendimento milagroso” carece do esforço de todos os que se locomovem na roda da política.
Comprimidos por demandas crescentes, sob a teia do endividamento dos entes federativos, os alcaides estão conscientes de que seu papel é o de tentar que as comunidades consigam sobreviver ao caos que assola os municípios brasileiros. A cada ciclo político-eleitoral, escancara-se a hipótese: o fator econômico dita a condição da política, sendo responsável, aqui e alhures, pelo conjunto de mudanças na estampa do Estado contemporâneo.
A escassez de recursos propicia o aparecimento de figurantes menos populistas. A paisagem contém novos sinais. Os governantes, hoje, são mais suscetíveis aos humores e rumores da política, sujeitando-se todo tempo ao escrutínio das populações; os tempos de transparência exigem deles compromisso com a verdade; as comunidades clamam por soluções de curto prazo; o discurso com a abordagem de “preparar o amanhã”, “construir a pátria para nossos filhos e netos”, dá vez à expressão “o futuro é agora”; a interlocução entre líderes e liderados, antes de cima para baixo, hoje ocorre unilateralmente, em função da interatividade e horizontalidade proporcionadas pelas redes sociais; no lugar de heróis da Pátria, que “vendiam” esperança e felicidade, agora surgem gestores, devidamente paramentados em fatiotas de talhe econômico, que focam sua “venda” em artigos de primeira necessidade.
Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP e consultor político e de comunicação Twitter @gaudtorquato
Um comentário:
Menos, menos. O caminho está aí mas ainda não chegamos no Shangri-Lá do Torquato.
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