domingo, 21 de dezembro de 2008

As Gralhas Enfurecidas (024)

Três últimos capítulos publicados:
021 - em 14/12
022 - em 17/12
023 - em 19/12
____________________________________________________ Quando chegou em casa, Luiz Felipe ouviu o recado de Mercedes na secretária eletrônica: a irmã chegara de viagem, a mãe estava oferecendo um jantar e ela não poderia sair.
Luiz Felipe arrumou-se, desceu e encontrou, outra vez, seu carro preso na garagem pelo Fusca velho da velha do duzentos e dois. Pensou que precisava se mudar, ir morar num prédio decente e que no dia seguinte pediria a Suzana para procurar um novo apartamento. Não quis esperar pelo porteiro, pegou um táxi e foi para a livraria onde Renato, ex-colega da Faculdade, estava lançando seu livro de poesias.
Logo que entrou, viu Teresa sozinha, com uma taça de vinho branco na mão. Aproximou-se e cumprimentou-a:
- Esta coincidência está parecendo novela da Globo... nós nos conhecemos nesta semana e já estamos nos encontrando outra vez.
Teresa não considerou muito criativa a abordagem e estava pensando em dar também uma nota negativa, como ele fizera com o projeto dela. Mas mudou logo de idéia, porque ele era o cliente e devia deixar que as observações, boas ou imbecis, partissem dele.
- Você conhece o Renato ?
- Há muito tempo. Fomos colegas na Faculdade. Eu pouco exerci a Advocacia e ele menos ainda. Virou poeta...E você ?
- Nós publicamos o livro dele, muito bom, aliás, e vamos fazer a divulgação.
Conversaram por quarenta minutos e, depois de uma meia dúzia de taças de vinho, Luiz Felipe perguntou se Teresa não estava achando aquilo tudo muito chato e se não queria ir jantar.
- Eu estou lhe devendo uma demonstração de gentileza, depois daquela minha grosseria sobre o atraso com zê...
Teresa começou negando, alegando delicadamente, que estava ali cumprindo um compromisso profissional. Luiz Felipe argumentou que ela já cumprira e que estava surgindo um outro, certamente mais importante.
- Afinal, você está sendo convidada pelo possível futuro cliente da sua agência e um cliente, me desculpe o meu amigo Renato, muito mais importante...
Teresa hesitou. Tinha vontade de sair, jantar com Luiz Felipe por quem, ela continuava sem saber porque, sentira uma atração muito especial.
Ela enviuvara há dois anos e meio, dedicara-se apaixonadamente ao trabalho, nitidamente para ocupar seu tempo. Sua vida sentimental ficara relegada a um quinto plano mas não tinha sido totalmente esquecida. Nas poucas vezes em que freqüentara lugares considerados badalados, fora para cumprir compromissos profissionais.
Ela não era jovem, mas não era velha... Fora assediada diversas vezes, escapara sempre, não porque não quisesse mas porque, como os encontros eram quase sempre profissionais, não desejava se envolver para não prejudicar o plano de carreira que traçara, desde que o marido morrera.
Ela sabia que se seu projeto para a GLS Seguros fosse aprovado, ela teria reais chances de ganhar uma participação acionária na Mark and Spencer.
O homem que estava a sua frente, convidando-a para jantar era o executivo do possível cliente, o responsável pelo projeto de divulgação, quem, realmente, daria um parecer final para a Diretoria e este parecer, seu chefe não se cansava de lhe dizer, era uma peça fundamental em todo o processo. Aceitar o convite dele para jantar e, provavelmente, para algo mais, que certamente surgiria, poderia atrapalhar tudo... ou poderia ajudar ?
Na saída, o manobreiro trouxe o carro de Teresa. Luiz Felipe sentou-se, afivelou o cinto e estava namorando o painel do BMW.
- Acho que vou largar esta bobagem de securitário e fazer um curso de publicidade...
Teresa riu e disse que o carro não era dela, mas de seu pai.
- Eu sempre gostei de artes plásticas. Fiz Faculdade de Desenho Industrial. Meu pai é sócio de uma pequena indústria de peças de automóvel, cuja conta de publicidade está com a Mark and Spencer, praticamente desde o começo. Foi por isso que consegui uma vaga de estagiária.
Luiz Felipe não entendeu a relação com o carro mas preferiu não insistir. Achou que Teresa estava se exibindo. Só um pouco... mas estava.
Mas ela voltou a falar no automóvel.
- Meu carro enguiçou e meu pai me emprestou o dele...
Pensou um pouco se continuaria e decidiu que sim.
- Se nós ganharmos a conta da GLS, eu talvez possa ter um BMW também...
Luiz Felipe percebeu um ligeiro indício de negociação e resolveu manter o tom.
- Se vocês ganharem a conta, quem sabe você não me dá um também...
Teresa sentiu um ligeiro indício de suborno.
Jantaram no Troisgros. Teresa esforçava-se, sem muita convicção, para não se deixar impressionar por Luiz Felipe que, com muita desenvoltura, escolhia os vinhos, os pratos e conversava em francês com o “maitre”. Lembrava-se a cada minuto da observação de seu colega Paulo César. O pavão estava ali, abrindo as penas, se exibindo.
Quando saíram, Teresa dirigiu até o prédio onde Luiz Felipe morava, e ele, sem qualquer hesitação, convidou-a para subir, dizendo que ela tomaria o melhor café do Rio de Janeiro.
Teresa considerou o convite, outra vez, sem qualquer criatividade. Mas já estava achando que, afinal, ele representava um futuro cliente. Um futuro cliente muito importante. Subiu.
Luiz Felipe foi para a cozinha mas voltou logo, imitando o Jean Marie Qualquer Coisa e, acentuando o sotaque francês, disse que estava desolê, porque não tinha café. Teresa riu. Então, voltou a lembrar-se de Paulo César, afirmando que, na reunião na GLS, ele passara o tempo todo se exibindo para ela, como um pavão, o que tinha acontecido outra vez no restaurante e, sem dúvida, estava repetindo agora.
Houve então um silêncio embaraçoso.
Luiz Felipe percebeu e tentou livrar-se dele muito depressa. Convidou-a a ir até o quarto para ver o computador que acabara de comprar e começou a apregoar seus recursos, falando com o desembaraço de um Bill Gates, sobre coisas que ele não conhecia. Teresa lembrou-se outra vez de Paulo César e de sua segunda afirmação a qual, ela, agora, assustada, acreditava e queria
que fosse verdade... o pavão estava a fim dela.
Luiz Felipe já exibira todos os recursos de seu novo brinquedo. Não havia mais o que mostrar.
Satisfeito, deu as boas-vindas ao segundo silêncio embaraçador, desligou o micro, e olhou para Teresa.
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Capítulo 025 - Publicação prevista para 24/12

2 comentários:

Anônimo disse...

Escrevi em 7/12, no comentário do capítulo 19 que Luiz Felipe ia comer a Teresa.
Ainda não comeu... mas vai comer no capítulo 25 ?

Anastácio Soberbo disse...

Olá Roberto
Desejo para o senhor, sua família e amigos um Santo Natal e que o Papá Noel lhe traga tudo de bom, principalmente muita saúde e vontade para continuar com este lindo blogue.
Um forte abraço deste cantinho português.
BOM NATAL